sábado, 15 de fevereiro de 2014

O Lobo de Wall Street



O Lobo de Wall Street | Crítica
Martin Scorsese refaz os jogos de perspectivas e ilusões de filmes anteriores, agora em chave francamente cômica
Marcelo Hessel

The Wolf of Wall Street
EUA , 2013 - 180 minutos
Comédia

Direção:
Martin Scorsese

Roteiro:
Terence Winter

Elenco:
Leonardo DiCaprio, Jonah Hill, Margot Robbie, P.J. Byrne, Kyle Chandler, Rob Reiner, Jon Bernthal, Kenneth Choi, Henry Zebrowski, Jean Dujardin, Cristin Milioti, Matthew McConaughey, Jon Favreau, Brian Sacca, Spike Jonze, Joanna Lumley, Ethan Suplee, Jake Hoffman

Pelas similaridades da trama, da sedução do crime à traição, a comparação imediata que O Lobo de Wall Street (The Wolf of Wall Street) gera entre os filmes de Martin Scorsese é com Os Bons Companheiros (1990), mas a adaptação ao cinema do livro homônimo que narra a história de Jordan Belfort tem mais a ver com outro clássico de gângster do cineasta, Cassino (1995).

Ex-corretor da Bolsa de Nova York, Belfort fez fortuna nos anos 1990 explorando a fugacidade do mercado financeiro, um mundo onde se movimentam fortunas sem pudor ou remorso porque elas são, em boa medida, absolutamente imateriais. É o que diz, ainda nos anos 1980, o primeiro patrão de Belfort (Leonardo DiCaprio), interpretado no filme por Matthew McConaughey: o único dinheiro "real" naquele mundo de ações e flutuações é a comissão do corretor.
Mas a moeda também não deixa de ser um meio, uma convenção. Enquanto objeto criado para atribuir valor às coisas, ela não é um fim em si mesma; de que adiantaria ser rico sem gastar um centavo? O poder que o dinheiro tem, então, em última instância, é o de dar forma à realidade. Em Cassino isso é evidente: o filme se passa no meio de um deserto, o de Nevada, e ali o personagem de Robert De Niro molda seus sonhos à base de fichas de plástico, até o momento em que é forçado a dirigir para fora de Las Vegas e desperta: o lugar que ele imaginou para si ainda continua sendo um deserto.

Até perceber que também habita uma miragem, Belfort sem dúvida aproveita como consegue. O Lobo de Wall Street são três horas de drogas, mulheres, bebida, luxo e todo tipo de fantasia (com anões, carros, animais) que o dinheiro pode pagar. Scorsese e o roteirista Terence Winter fazem seu comentário sobre a imoralidade da vocação especulativa de Wall Street como se estivessem realizando um Se Beber, Não Case! ou qualquer outra comédia de ressaca, e testando não necessariamente os limites do bom senso, mas acima de tudo os limites da realidade.

Porque o caso de Belfort aqui, como o de De Niro em Cassino, continua sendo a maneira como esses personagens constroem uma realidade de sonho para si. De Niro tem todas as luzes de Las Vegas e o brilho das joias de Sharon Stone para atordoá-lo, enquanto Belfort vê pelo filtro de estimulantes e sedativos o mundo que seu dinheiro criou. Quando o seu escritório se enche de repente de strippers, bichos e fanfarras em meio aos engravatados, ou quando um avião lotado sacode e fica impossível definir onde termina um corpo e começa o próximo, parece que estamos diante de pinturas de um bacanal renascentista ou mesmo um daqueles quadros de Onde Está Wally?, representações aumentadas da realidade.

É engraçado notar que tanta gente sai do cinema revoltada com os excessos de O Lobo de Wall Street, porque na verdade essas cenas são de certa forma irreais na sua idealização, justamente pelos excessos. O fato de os personagens não enxergarem essa irrealidade é tema central aqui e fonte de uma piada atrás da outra. Belfort evita o quanto pode racionalizar o mundo ao seu redor ("Esquece, você não está prestando atenção mesmo", esquiva-se diante do espectador quando precisa explicar algo) e as consequências têm efeito tragicômico, quando não puramente cômico. "Eu realmente acabei de ver aquele avião explodir na minha frente?", questiona o personagem numa cena.

Entre chroma-keys propositalmente artificiais (Londres e Suíça nunca tiveram aquela paisagem verde-limão) e imagens pensadas para nos revelar a forma distorcida como Belfort vê tudo (o plano em que a mulher dá as costas a ele entre a fumaça e a água turva do vidro do carro é um exemplo), Scorsese nunca deixa de dar pistas de que há algo de errado no olhar, desde o momento em que a Ferrari muda de cor sob o comando do narrador. Não por acaso, a atuação de DiCaprio aqui lembra os estados de transe de seus personagens em O Aviador e Ilha do Medo, dois outros filmes narrados pelo ponto de vista duvidoso dos seus protagonistas, como fluxos de consciência.

Então engana-se quem acha que O Lobo de Wall Street faz o elogio do excesso, embora o filme se divirta bastante com a glória de Belfort. Ao nos impor a perspectiva do personagem sem meios termos - a ponto de o filme abrir não com a vinheta da Paramount e sim com a da firma do corretor - Scorsese desafia o espectador a questionar não só o que vê mas também o que sente.

Texto e fotos retiradas do site Omelete.

Opinião de Ricardo Tavares: O filme é muito bom. Concorre a vários Oscar's, incluindo Filme e Diretor. Ubatombo recomenda.






Os Croods

Os Croods | Crítica

Animação pré-histórica usa fórmula a seu favor e diverte pais e filhos
Marcelo Forlani

The Croods
EUA , 2013 - 98 min.
Animação / Infantil

Direção:
Kirk De Micco, Chris Sanders

Roteiro:
Kirk De Micco, Chris Sanders

Elenco:
Nicolas Cage, Emma Stone, Ryan Reynolds, Catherine Keener, Cloris Leachman, Clark Duke

Ser pai (e mãe) não é fácil. Na época dos neadertais era ainda pior, com certeza. Sabendo disso e vendo todas as famílias ao seu redor sumindo do mapa, Grug (voz original de Nicolas Cage), tem uma regra para sua família, os Croods: fiquem dentro da caverna! Quem não gosta disso é sua filha adolescente Eep (Emma Stone). Tão curiosa quanto agilizada, ela sai para explorar a cada virada de pescoço do pai. Em uma destas escapadas ela conhece Guy (Ryan Reynolds) e o fogo! E se apaixona - pelos dois! Depois que um acidente chamado "início do fim do mundo" destrói a caverna deles, os Croods são obrigados a procurar um novo abrigo e é assim que começa a aventura.
A DreamWorks Animation mais uma vez foi atrás de algo simples e que está virando sua especialidade: divertir a família. E conseguiu de novo. A animação criada e dirigida por Kirk De Micco (Space Chimps - Micos no Espaço) e Chris Sanders (Como Treinar Seu Dragão) equilibra muito bem as cenas de ação com as de comédia, com sequências capazes de agradar tanto aos filhos quanto aos pais. As piadas vão desde o humor físico do bicho-preguiça de estimação de Guy ao "sofisticado" deslumbramento das meninas pelos sapatos - algo que, aparentemente, vem desde a pré-história.

Graficamente o traço dos personagens pode desagradar aos que buscam cada vez mais o realismo nos personagens gerados por computador. Mas o 3D é trabalhado na medida certa, utilizando elementos como fuligem, faíscas e poeira para criar o ambiente tridimensional, sem se limitar a jogar coisas na direção da plateia. Ao fazer isso, aliás, eles conseguem ampliar o horizonte e mostrar cenários mais realistas, criando um interessante contraste com o estilo de desenho dos personagens. Ajuda também o bom trabalho de "câmera", principalmente em sequências como a caçada do início, que possui até elementos de futebol americano.

Se a história não é um primor de criatividade, ninguém vai poder dizer que ela é mal contada. O desenvolvimento da trama segue à risca a fórmula já testada, com ação, pausas e piadas inseridas cirurgicamente ao longo da caminhada dos Croods fugindo do apocalipse. Fora tudo isso, há a descoberta dos sentimentos que são realmente importantes em você, uma evocação, ainda que bem leve, ao espírito dos projetos da Pixar que não têm carros vermelhos como protagonistas.

Créditos:
Texto: Omelete.
Fotos: Internet.

Opinião de Ricardo Tavares: Uma animação bem divertida da "Idade da Pedra" que é espelhada nas crenças e relações familiares atuais. Está concorrendo ao Oscar de melhor animação, tem grande chances de vencer.







quarta-feira, 5 de fevereiro de 2014

Gravidade | Crítica

Gravidade | Crítica
Suspense espacial de Alfonso Cuarón encanta-se com a fragilidade e a tenacidade humanas

Érico Borgo
07 de Setembro de 2013

Gravity
EUA, Inglaterra , 2013 - 90 min
Ficção científica

Direção:
Alfonso Cuarón

Roteiro:
Alfonso Cuarón, Jonás Cuarón

Elenco:
Sandra Bullock, George Clooney, Eric Michels, Basher Savage, Paul Sharma

Um ensaio milionário sobre solidão, fragilidade e autocontrole. Este é Gravidade (Gravity, 2013), novo filme do diretor mexicano Alfonso Cuarón.


A ficção científica se passa no espaço, na órbita terrestre, a 600 quilômetros de altura. Nela, uma equipe de astronautas e cientistas instala novas partes no telescópio Hubble quando chega o alerta: uma nuvem de detritos está chegando em alta velocidade à sua posição. Em minutos, toda a segurança da nave se vai - e restam apenas a Dra. Ryan Stone (Sandra Bullock) e o comandante da missão, Matt Kowalsky (George Clooney), indefesos vagando pelo espaço.

Cuarón faz aqui o tipo de filme que costuma ser visto em baixo orçamento: apenas dois personagens que precisam superar uma situação insuperável. No entanto extrapola essa ideia - normalmente uma solução criativa minimalista para uma verba apertada -, empregando-a de forma grandiloquente. E tome visuais de tirar o fôlego (especialmente em 3D), explosões em gravidade zero e longos e aflitivos planos sem cortes que passeiam de dentro para fora dos capacetes dos personagens enquanto eles discutem sua situação.


Gravidade é um deleite técnico. A alternância entre som e silêncio amplifica o drama e a trilha sonora aflitiva de Steven Price entra apenas em momentos cruciais. A animação (o filme é quase que todo em computação gráfica) é perfeita e realista e a tensão é absolutamente constante, já que não há momentos de respiro (ainda que o filme encontre um hilário em Clooney, charmoso como nunca). E Bullock dá um show como a astronauta novata que já perdeu tudo, mas que decide viver.

Esteta, Cuarón encontra no espaço e o controle milimétrico de seu set. Há cenas de beleza intensa e grande significado, como os "renascimentos" da Dra. Stone, especialmente o primeiro, em que a vemos pela primeira vez como mulher, como humana, indefesa fora da casca protetora do uniforme de astronauta.

Nas lágrimas sem gravidade, Cuarón aprecia a beleza da fragilidade humana - e sua tenacidade.

Fotos e texto retirados do site Omelete.

Opinião de Ricardo Tavares: um grande filme e um filme sufocante. Com tomadas longas, principalmente as iniciais o filme mostra a luta pela sobrevivência da Dra. Ryan Stone (Sandra Bullock) a todo momento. Este filme é a grande aposta do Oscar.